Terça-feira 04 de fevereiro - JOGANDO CONTRA O PRÓPRIO GOL - Uma esquerda que ama se autoflagelar

04/02/2025

Nos últimos dias, um simples boné azul conseguiu gerar um volume impressionante de discussões, análises e, claro, reclamações. Criado por Sidônio Palmeira, estrategista da comunicação do governo Lula, o acessório trazia a frase "O Brasil é dos brasileiros" e rapidamente virou símbolo de embate político no Congresso. Mas, enquanto a oposição se agitava para criar uma resposta à altura, um fenômeno curioso aconteceu dentro da própria esquerda: uma avalanche de insatisfações, correções e críticas estéticas tomou conta do debate. O azul foi alvo de queixas. A tipografia foi questionada. Até uma acusação absurda de xenofobia apareceu e para isto eu recomendo o excelente e irretocável artigo de Roberto Ponciano, publicado aqui no 247. A esquerda, mais uma vez, mostrou sua incrível capacidade de transformar um acerto em motivo de autoflagelo. E enquanto alguns se empenhavam em dissecar os mínimos detalhes do acessório, a oposição já havia respondido com seu próprio boné e até pacotes de café irônicos. A verdade é que a esquerda brasileira tem uma dificuldade crônica em simplesmente celebrar vitórias simbólicas. Qualquer ação precisa passar por um escrutínio interminável, como se fosse possível atingir um estado de pureza ideológica e estética antes de ser validada. Enquanto isso, a direita age com pragmatismo: não perde tempo debatendo a tonalidade de um boné ou o design de uma fonte. Veste a camisa ou o boné e parte para a batalha comunicacional sem grandes angústias. Esse comportamento não é novo. Há tempos esta esquerda aqui parece mais confortável com a crítica do que com a celebração. Talvez seja um resquício do pensamento acadêmico que privilegia a desconstrução sobre a construção, ou talvez seja o reflexo de uma militância que se acostumou ao papel de resistência e não sabe muito bem o que fazer quando obtém pequenas vitórias no jogo da narrativa pública. Enquanto a direita ri e usa suas ferramentas de comunicação com coesão, a esquerda perde tempo em budejos intermináveis, analisando o que poderia ter sido feito de forma mais inclusiva, mais estética ou mais "correta". O problema é que, no campo da política, comunicação também é poder e simbologia também se disputa. E se a esquerda não aprender a ser feliz com seus próprios símbolos, corre o risco de perder até mesmo o direito de criá-los.

Este é um artigo de opinião, de responsabilidade da autora Sara Goes comunicadora brasileira, e não reflete a opinião do PORTAL